O procurador-geral da República, Augusto Aras, declarou em nota oficial, nesta terça (19), que não se sente obrigado a avaliar ilícitos atribuídos ao presidente da República, Jair Bolsonaro, na gestão da crise de saúde pública.
Em relação a tentativa da oposição de impor ao presidente um impeachment, o PGR disse:
“Eventuais ilícitos que importem em responsabilidade de agentes políticos da cúpula dos Poderes da República são da competência do Legislativo.”
Augusto Aras fez um importante alerta sobre a crise de saúde pública dizendo:
“O estado de calamidade pública é a antessala do estado de defesa. A Constituição Federal, para preservar o Estado Democrático de Direito e a ordem jurídica que o sustenta, obsta alterações em seu texto em momentos de grave instabilidade social.”
O estado de defesa está previsto no artigo 136 da Constituição Federal e pode ser decretado pelo presidente, após ouvir os conselheiros da República e de Defesa Nacional.
O Conselho da República é órgão superior de consulta do Presidente da República, e dele participam:
I – o Vice-Presidente da República;
II – o Presidente da Câmara dos Deputados;
III – o Presidente do Senado Federal;
IV – os líderes da maioria e da minoria na Câmara dos Deputados;
V – os líderes da maioria e da minoria no Senado Federal;
VI – o Ministro da Justiça;
VII – seis cidadãos brasileiros natos, com mais de trinta e cinco anos de idade, sendo dois nomeados pelo Presidente da República, dois eleitos pelo Senado Federal e dois eleitos pela Câmara dos Deputados, todos com mandato de três anos, vedada a recondução.
Já o Conselho de Defesa Nacional é presidido pelo Presidente da República e dele participam como membros natos:
I – o Vice-Presidente da República;
II – o Presidente da Câmara dos Deputados;
III – o Presidente do Senado Federal;
IV – o Ministro da Justiça;
V – o Ministro da Marinha;
VI – o Ministro do Exército;
VII – o Ministro das Relações Exteriores;
VIII – o Ministro da Aeronáutica;
IX – o Ministro da Economia, Fazenda e Planejamento.
O estado de defesa prevê a imposição de medidas coercitivas, prisão e restrições ao direito de reunião e ao sigilo de correspondências e de telefonemas.
O Congresso Nacional teria dez dias para aprovar ou rejeitar o decreto.
Confira a íntegra da nota divulgada pela Procuradoria-Geral da República:
“O Decreto Legislativo 6, de 20 de março de 2020, reconheceu o estado de calamidade pública no país até 31 de dezembro de 2020. Em 30 de dezembro, o Supremo Tribunal Federal (STF) estendeu a validade dos dispositivos da Lei 13.979/2020, que estava vinculada ao prazo do Decreto Legislativo 6, mantendo em vigor as medidas sanitárias para combater a pandemia da covid-19.
O estado de calamidade pública é a antessala do estado de defesa. A Constituição Federal, para preservar o Estado Democrático de Direito e a ordem jurídica que o sustenta, obsta alterações em seu texto em momentos de grave instabilidade social. A considerar a expectativa de agravamento da crise sanitária nos próximos dias, mesmo com a contemporânea vacinação, é tempo de temperança e prudência, em prol da estabilidade institucional.
Segmentos políticos clamam por medidas criminais contra autoridades federais, estaduais e municipais. O procurador-geral da República, no âmbito de suas atribuições e observando as decisões do STF acerca da repartição de competências entre União, estados e municípios, já vem adotando todas as providências cabíveis desde o início da pandemia. Eventuais ilícitos que importem em responsabilidade de agentes políticos da cúpula dos Poderes da República são da competência do Legislativo.
Desde a chegada do novo coronavírus ao Brasil, o PGR criou o Gabinete Integrado de Acompanhamento da Epidemia Covid-19 (Giac), que, juntamente com o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), estabeleceu diálogo e integração entre segmentos da sociedade e autoridades em todos os níveis de governo, resolvendo questões emergenciais no cotidiano dos serviços de saúde.
Também tem realizado a fiscalização de verbas destinadas ao enfrentamento da pandemia, em trabalho conjunto com todo o Ministério Público brasileiro e com os tribunais de contas, e abriu inquéritos criminais contra oito governadores suspeitos de desvios, tendo um deles sido afastado do cargo.
As medidas intensificaram-se nos últimos dias, diante do grave quadro registrado em Manaus devido à falta de oxigênio medicinal em hospitais. O PGR abriu investigação criminal sobre atos envolvendo o governador do estado do Amazonas, o prefeito atual e o ex-prefeito de Manaus por suposta omissão. Requisitou a instauração, pelo Ministério da Saúde, de um inquérito epidemiológico e sanitário, instrumento usado pela primeira vez, embora esteja previsto na lei desde 1975. Solicitou esclarecimentos ao ministro da Saúde sobre sua atuação quanto à falta de oxigênio na capital amazonense.
Neste momento difícil da vida pública nacional, verifica-se que as instituições estão funcionando regularmente em meio a uma pandemia que assombra a comunidade planetária, sendo necessária a manutenção da ordem jurídica a fim de preservar a estabilidade do Estado Democrático.
O PGR continuará investigando atos ilícitos e contribuindo para que a ordem jurídica, centrada na Constituição e nas leis do país, seja observada, a fim de que não haja o alastramento da crise sanitária para outras dimensões da vida pública.”