Na primeira noite após os Estados Unidos e aliados ocidentais da OTAN permitirem que a Ucrânia utilizasse suas armas contra o território russo, as forças de Vladimir Putin lançaram um grande ataque aéreo em quase todo o país, invadido em 2022.
A mensagem russa foi contundente na noite de sexta (31) e madrugada de sábado (1º), sendo o maior ataque desde o ocorrido em 22 de março, que havia sido o segundo mais intenso do conflito. Kiev informou ter derrubado 35 dos 53 mísseis e 46 dos 47 drones.
O ataque impressionou não só pelo número de armamentos, mas também pelo seu alcance. Foram alvejadas regiões no norte, centro, sul e oeste da Ucrânia, incluindo áreas próximas às fronteiras com a Polônia e a Hungria. Explosões foram relatadas em pelo menos nove cidades, incluindo a capital Kiev e Lviv (oeste), e alarmes soaram em todo o país.
O alvo principal foi, novamente, o sistema de energia da Ucrânia. Cinco regiões sofreram blecautes, com danos mais severos em Vinnitsia (centro). Duas centrais termoelétricas foram atingidas, e pelo menos quatro pessoas ficaram feridas.
Diversos tipos de armamentos foram utilizados no ataque. Drones iranianos Shahed-136 foram lançados nas ondas iniciais para atrair a defesa aérea, seguidos por mísseis de cruzeiro supersônicos Kh-101 e pelo menos seis bombardeiros estratégicos Tu-95, que decolaram de Olenia e Engels, na Rússia.
Houve pelo menos duas ondas de ataques, causando pânico nos sistemas de alerta em canais de Telegram ucranianos. Kiev afirmou ter abatido 30 dos 35 drones lançados e um míssil de cruzeiro Iskander-K.
Também foram disparados dez mísseis de cruzeiro subsônicos Kalibr de navios, algo que não acontecia há algum tempo devido à destruição de embarcações da Frota do Mar Negro russa. Segundo registros de Kiev, os disparos ocorreram perto da costa da Crimeia anexada, e quatro deles foram abatidos.
Além disso, foram lançados quatro mísseis balísticos Iskander-M, que atingiram seus alvos. Caças MiG-31K também decolaram, mas não lançaram os mísseis hipersônicos Kinjal normalmente utilizados.
Do lado russo, o governo da região ocupada de Donetsk afirmou que pelo menos cinco pessoas morreram devido ao bombardeio promovido pelos ucranianos.
OS MOTIVOS
Nesta sexta-feira, os Estados Unidos e a Alemanha confirmaram que autorizaram o governo de Volodimir Zelenski a utilizar armas ocidentais contra alvos militares dentro da Rússia pela primeira vez.
Tanto o escritório do premiê Olaf Scholz quanto o secretário de Estado americano, Antony Blinken, informaram que essas ações devem se restringir ao sul da Rússia, próximo à fronteira com a região ucraniana de Kharkiv. Desde 10 de maio, essa área tem sido alvo de uma nova ofensiva iniciada por Putin.
As forças russas fizeram ali os maiores avanços desde os primeiros dias da guerra. As linhas de frente parecem estabilizadas, mas isso custou muitas reservas ucranianas de outros pontos da linha de batalha de 1.000 km. Como resultado, Moscou também obteve ganhos no leste e no sul.
A gravidade da situação despertou o Ocidente, após quase seis meses de inércia devido à demora dos EUA em aprovar novas ajudas a Kiev, resultado da disputa no Congresso entre os republicanos de Donald Trump e os democratas de Joe Biden, que enfrentará seu antecessor em novembro.
Nas últimas semanas, a França sugeriu o envio de tropas para a Ucrânia e diversos países começaram a permitir o uso de suas armas contra a própria Rússia, não apenas nas áreas ocupadas. A região de Belgorod tornou-se um campo de batalha, com ataques diários realizados com armas ucranianas.
Putin reagiu com exercícios nucleares, renovando esse tipo de ameaça aos rivais, e mencionou a possibilidade de uma guerra global iminente. Ele prometeu atacar alvos britânicos se mísseis fornecidos por Londres e disparados pelos ucranianos atingirem bases na Rússia.
Na quinta-feira (30), uma reunião dos chanceleres da OTAN em Praga discutiu o assunto. No mesmo dia, a Dinamarca anunciou que permitirá o uso dos 19 caças F-16 que irá fornecer futuramente a Kiev contra alvos na Rússia.
Seguiram-se relatos anônimos sobre a autorização americana, a mais importante, dado o peso dos EUA no apoio bélico a Kiev, e a confirmação veio nesta sexta-feira. Os limites apresentados por Washington e Berlim são um teste para medir a reação russa, como já ocorreu com outras linhas vermelhas no passado.
É necessário, claro, observar o que de fato acontecerá na prática, como o próprio Zelenski disse. Por enquanto, o padrão do Kremlin de lançar um grande ataque após uma má notícia política se manteve, mas é incerto o que ocorrerá quando houver danos significativos dentro da Rússia causados por armas ocidentais.
Neste sábado, o presidente Zelenski voltou a apelar por mais ajuda em uma postagem no Telegram. “Os parceiros sabem exatamente o que é necessário. [Baterias antiaéreas] Patriot adicionais, e outros sistemas modernos de defesa aérea. Acelerar e expandir a entrega de F-16 para a Ucrânia. Prover nossos soldados com todas as capacidades necessárias”, disse.