Deputados da oposição ao governo Lula retomaram a batalha contra a regulação da internet, lançando uma campanha contra o projeto de lei destinado a regular o setor de streaming, que entrou na pauta de votação da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (14). No entanto, devido à reação negativa dos parlamentares oposicionistas, o projeto não foi apreciado.
Este seria o primeiro imposto setorial sobre as big techs no Brasil, que atualmente pagam apenas imposto de renda e sobre serviços. O governo está discutindo formas de tributar as plataformas de internet, incluindo as de vídeo sob demanda.
As plataformas criticam o projeto, alegando que ele foi feito sob medida para a Globo, pois permite que empresas de streaming vinculadas à radiodifusão do país reduzam sua contribuição a zero. Elas também se opõem às cotas para conteúdo brasileiro nas plataformas de streaming.
Com as hashtags #PLdaCensura e #PLdaGloboNão, deputados da oposição acusam o PL 8.889/2017 de ser uma reedição do PL das Fake News e uma tentativa de censurar a internet e beneficiar a Rede Globo. O tema chegou ao topo dos assuntos do momento na rede social X (antigo Twitter) na terça e nesta quarta-feira (15), sendo alvo de discursos de parlamentares no plenário da Câmara.
O projeto prevê uma contribuição das plataformas de vídeo sob demanda de até 6% da receita anual bruta para o Condecine (Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional). Os recursos dessa contribuição compõem o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), destinado ao fomento do setor.
Segundo um levantamento com a ferramenta LupaScan, de monitoramento de canais públicos nas redes sociais de políticos eleitos, a bancada bolsonarista se mobilizou pelas redes sociais para barrar a proposta, tal como fez com o PL da Censura.
CONFIRA A REAÇÃO DA OPOSIÇÃO PARA RETIRAR O PROJETO DE PAUTA
“URGENTE! Querem empurrar o PL da censura e taxação de conteúdo da internet hoje ou amanhã”, disse em vídeo no YouTube o deputado Gustavo Gayer (PL-GO). “Estão tentando hoje ou amanhã enfiar goela abaixo mais uma vez o PL das fake news, mas agora com uma nova cara, uma nova maquiagem… para empurrar goela abaixo a censura e a regulamentação das redes sociais.”
DE QUEM É O TEXTO DO PROJETO
O texto é assinado pelo então deputado Paulo Teixeira (PT-SP), atual ministro do Desenvolvimento Agrário, em 2017, e relatado por André Figueiredo (PDT-CE). Ele foi à tribuna do plenário na terça para pedir o apoio ao projeto e se colocar à disposição para conversar com as bancadas, buscando destravar a votação.
O QUE PENSA ARTHUR LIRA
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), reconheceu ser um “texto polêmico”, mas disse haver uma “convergência da maioria dos setores nacionais” pelo conteúdo da matéria. “Ela está há muitos anos [em discussão] e é importante que a gente resolva isso”, disse.
Apesar disso, parlamentares de partidos da oposição e da base do governo Lula (PT) na Casa avaliam que o debate foi contaminado pelas críticas -e, portanto, deverá sair do radar da Câmara.
“Como eles viram que não tinham votos para aprovar o PL 2.630, estão dividindo o seu conteúdo em outros projetos, com objetivo de calar as redes sociais”, diz à Folha de S.Paulo o deputado bolsonarista Cabo Gilberto Silva (PL-PB). “Da mesma forma que atuamos no ano passado, vamos mostrar ao povo que esse projeto é maléfico à sociedade.”
O QUE DIZ O PROJETO
A contribuição de 6% da receita anual bruta seria obrigatória para plataformas de streaming como Netflix, Amazon Prime e Globoplay, redes de compartilhamento de vídeos como YouTube e TikTok e os provedores de televisão por aplicação de internet, como as TVs Samsung e LG, que oferecem acesso aos canais.
Essa taxa seria abonada pela metade (3%) em caso de serviços classificados como plenos, ou seja, com ao menos 50% de conteúdo nacional em seu catálogo, e poderia ser zerada em caso de aplicação do valor em produção de conteúdo audiovisual brasileiro. Seria o caso do Globoplay e da PlayPlus, da Record.
Ainda, os 3% restantes podem, em vez de pagos como contribuição, ser aplicados pelo provedor em iniciativas de fomento direto ao audiovisual no Brasil, seja produzindo ou licenciando conteúdos, formando mão de obra ou operando infraestrutura voltada ao tema.
Há, porém, restrições: metade destes 3% residuais precisa ser aplicado na produção ou licenciamento de conteúdos brasileiros independentes ou de produção própria. A Globoplay ou a PlayPlus poderiam investir em produção de conteúdo brasileiro, por exemplo. Com isso, ficariam isentas dos 6% do Condecine.
Já a Netflix, que não é uma provedora de vídeo plena por não ter 50% de seu catálogo em conteúdo brasileiro, poderia reduzir a contribuição devida de 6% para 3%. Para isso, teria de investir esses 3% devidos na produção de conteúdos brasileiros, e mão de obra para o audiovisual no Brasil.
O TikTok e o YouTube também poderiam, em tese, reduzir sua contribuição ao Condecine. No entanto, apontam as empresas, isso é impossível, já que ambas possuem apenas a monetização (divisão dos ganhos em publicidade) do conteúdo com seus criadores como modelo de negócio.
Como resultado, as big techs seriam taxadas em 6%, enquanto as plataformas de streaming ligadas à radiodifusão poderiam reduzir sua contribuição para zero.
VOTAÇÃO DO PROJETO
O deputado André Figueiredo (PDT-CE) irá ao longo desta semana se reunir com líderes para viabilizar a votação do projeto de lei 8.889/2017, que regula o mercado de streaming. Figueiredo é relator da matéria, mas retirou o texto da pauta do plenário por entender que ainda não havia acordo sobre o texto. Figueiredo quer votar o projeto na próxima semana.
O texto estava previsto para ser votado nesta quarta, 15, mas como ainda há conversas que precisam ser feitas, está previsto para ser votado semana que vem. O deputado também não descartou a possibilidade de pequenas alterações no relatório.